Fonte: Remixtures
Até ontem, o nome Elinor Ostrom poderia ser desconhecido para qualquer defensor da cultura livre e partilhador mas agora que esta cientista política professora da Universidade de Indiana recebeu juntamente com Oliver Williamson, o Prémio Nobel da Economia de 2009, achei conveniente salientar aqui o seu trabalho em defesa dos bens comuns ou commons devido à sua importância fulcral no acesso livre aos bens culturais e ao conhecimento.
Esta não é a primeira vez que a Academia Real das Ciências da Suécia premeia alguém dentro do mundo da Economia com uma visão bastante céptica do sistema de propriedade intelectual em vigor. Veja-se o caso de Joseph Stiglitz.
Mas o caso de Elinor Ostrom é diferente. As suas investigações relativas ao modo como a apropriação de bens materiais e imateriais por uma pequena minoria podem prejudicar o conjunto da sociedade serviram de inspiração directa e indirecta a vários movimentos defensores desse grande ecossistema digital que é a Internet.
Movimentos como o do software livre e da cultura livre, assim como projectos mais específicos como a associação Creative Commons, a enciclopédia colaborativa Wikipedia e o Internet Archive foram beber aos livros de Ostrom como Governing The Commons de 1990 a ideia de que é possível criar comunidades auto-geridas pelos utilizadores segundo um modelo não hierárquico sem que ocorra um esgotamento dos recursos disponíveis devido à sobre-exploração por parte de alguns abusadores.
Para tal, é apenas necessário um pequeno conjunto de princípios instituídos a nível local e aprovados pelos membros. Em certas situações, argumenta Ostrom, o nível de eficácia económica destes recursos acaba por ser mais elevado do que o da apropriação dos bens por uma minoria de proprietários. No fundo, o que ela demonstra é que para além do controlo dos recursos pelo Estado e do domínio do mercado, existe uma terceira solução assente no cooperativismo e pela autogestão e que essa via pode ser muito mais vantajosa do que a teoria económica convencional nos fazia acreditar.
Nesse sentido, a atribuição do Prémio Nobel da Economia a Ostrom é um autêntico “golpe de rins” aplicado a todos os defensores da crença neo-liberal de que não existe outra alternativa à economia de mercado centrada no individualismo puro e no “salve-se quem puder.”
Mas se o trabalho original de Ostrom começou por se focar essencialmente em bens escassos e rivais como os recursos naturais (mares, campos, florestas, lagos, atmosfera, água, etc.), nos últimos anos a sua atenção começou a deslocar-se para o campo dos recursos não rivais e abundantes, bens digitais que permitem o acesso à informação e ao conhecimento.
É que apesar do surgimento desses movimentos em defesa da partilha do saber e do conhecimento em regime de co-propriedade, as últimas duas décadas ficaram também marcadas por um novo tipo de emparcelamento dos bens comuns semelhante ao registado com as enclosures ocorridas na Inglaterra no final do século XIII, como James Boyle denuncia. O que está em causa é a apropriação desse bem comum que é a Rede por uma mão-cheia de entidades privadas: exemplos disso são a introdução das DRMs, o aumento do número de concessões de patentes e os sucessivos alargamentos do prazo de protecção concedido pelos direitos de autor.
Em Ideas, Artifacts and Facilities: Information as a Common-pool Resource, escrito em co-autoria com Charlotte Hess em 2003, Elinor Ostrom denuncia o facto de “informação que costuma estar anteriormente livremente disponível estar a ser crescentemente privatizada, monitorizada, encriptada e restrita.” Segundo ela, “o emparcelamento é provocado por conflitos e contradições entre as leis de propriedade intelectual e as capacidades alargadas das novas tecnologias.”
O artigo termina afirmando que “os governos, as forças do mercado, as editoras e as bibliotecas universitárias tradicionais podem ter uma influência, mas são incapazes de travar o movimento internacional da informação distribuída. As características físicas e virtuais da informação digital distribuída criaram um tipo de artefacto informacional totalmente novo.”
Agora que os estudos de Ostrom foram reconhecidos com um Prémio Nobel, esperemos que as faculdades de economia deste e de outros países comecem a ter em conta esta interessante linha de investigação e não apenas os “mandamentos” da teoria económica convencional.
Foto de wfiupublicradio segundo licença CC-BY-NC 2.0
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