terça-feira, março 9

Será que as relações de longa duração matam o amor romântico? Parece que, afinal, não tem de ser assim

Fonte: Review of General Psychology 2009

Hoje apresentamos-lhe as conclusões de um artigo recente de Bianca P. Acevedo e Arthur Aron, da Universidade Stony Brook que examina a possibilidade de o amor romântico (com intensidade, entrega e interesse sexual) poder existir nas relações a longo termo. Uma revisão das taxonomias, teoria e pesquisa sugere que o amor romântico, sem a obsessão, componente típico da fase inicial do amor romântico, pode existir e existe em casamentos de longa duração e está associado à satisfação no casamento, bem-estar e  a um alto grau de auto-estima. Reforçando a separação dos papéis do amor romântico e da obsessão nas relações a longo prazo, uma análise com um conjunto moderadamente grande de casais de uma comunidade identificou factores latentes independentes para o amor romântico e a obsessão e um sub-conjunto de indivíduos reportaram níveis muito altos de amor romântico (mas não de obsessão), mesmo após o controlo do factor de desejo social. Finalmente, uma meta-análise de 25 estudos relevantes concluiu que em relações de curta ou longa duração, o amor romântico (sem obsessão) estava fortemente associado com a satisfação na relação, mas a obsessão estava negativamente correlacionada com essa satisfação nas relações de longa duração e positivamente correlacionada nas de curta duração.



Devemos estar sempre apaixonados. É por este motivo que nunca deveremos casar. 
[Oscar Wilde]


Na cultura ocidental contemporânea, o amor romântico é uma parte importante do casamento. A maior parte dos indivíduos considera o amor romântico como a razão do casamento (Dion & Dion, 1991) e o seu desaparecimento igualmente motivo para terminar o casamento (Simpson, Campbell, & Berscheid, 1986). Cada vez mais, o amor romântico e o casamento são vistos como fonte de satisfação pessoal e expressão  (Dion & Dion, 1991). Ironicamente, no entanto, acreditamos que o amor romântico desaparece com o tempo e que, na melhor das possibilidades, evolui para um "brilho morno" (Reik, 1944) de amor companheiro, um amor do tipo amizade. Porque é que algo que é  considerado crítico, senão o motivo para o casamento, pode aparentar desaparecer de forma inevitável?
Psicólogos e terapeutas intrigaram-se sobre a possibilidade do amor romântico em casamentos de longa duração. Alguns assumiram que níveis muito altos de amor romântico em relações de longa duração podiam ser ineficientes, tendo um alto custo metabólico (p.ex., Fisher, 2006) e talvez mesmo afastando os amantes das obrigações familiares, profissionais e para com a comunidade. Talvez outros se tenham deixado convencer pelos relatórios da comunicação social que faziam sobressair o lado escuro do amor e do casamento (ou seja, taxas de divórcio, infidelidade, assédio, violência doméstica, etc.). Finalmente, mantendo a ideia de que o amor romântico não foi feito para durar, permite que aqueles com boas, mas não espectaculares relações, mantenham o status quo e evitem as ameaças que advém de altos níveis de amor nas relações de longa duração. De facto, esta parece ser uma estratégia racional (mesmo se baseada num mito), uma vez que o bem-estar da relação parece beneficiar de forma significativa da comparação social para baixo com outros casais (Rusbult, Van Lange, Wildschut, Yovetich, & Verette, 2000). Ou talvez, como proposto por Mitchell (2002), o amor possa prevalecer, mas numa tentativa de garantir a segurança e minimizar os riscos de ter expectativas pouco realistas a respeito da certeza da relação desistam do amor romântico ao longo do tempo.
Determinar se o amor romântico pode sobreviver ao tempo e, caso afirmativo, como se processa nas relações de longa duração, é importante para compreender os princípios básicos das relações, as suas aplicações e as suas fundações evolucionarias. Por exemplo, a possibilidade de amor romântico em relações de longa duração sugere que precisamos de considerar mais do que a mera ausência de problemas e conflitos (o grande enfoque da literatura actual sobre os casamentos).  A possibilidade de um amor romântico de longa duração pode igualmente modificar as percepções dos terapeutas e dos indivíduos, de forma a que estes tenham expectativas mais altas sobre as relações. Desta forma, parceiros de longa duração teriam menos tendência a procurar parceiros alternativos ou a terminar as relações, em vez de enfrentar o que parece um desafio impossível, o de conseguir um amor romântico nos seus casamentos. Isto presume que as pessoas ainda tenham vontade de se comprometer com relações a longo prazo. A ideia de que o tempo mata o amor romântico chega a fazer as pessoas desistirem do casamento.
Neste artigo, argumentamos que o amor romântico - com intensidade, entrega e interesse sexual - pode durar. Embora não inclua usualmente a qualidade de obsessão da fase inicial do amor, não tem de inevitavelmente morrer ou tornar-se num amor de companheirismo - um amor morno, menos intenso, no qual a atracção e desejo sexual desapareceram. Sugerimos que o amor romântico tanto nas suas fases tardias como iniciais pode possuir as qualidades da intensidade, entrega e animação sexual. Revemos brevemente as taxonomias relevantes, perspectivas teóricas e pesquisa; apresentamos uma nova análise dos dados existentes de casais de longa duração; reportamos a meta-análise sobre a associação da satisfação nas relações com o amor romântico nas durações de longa e curta duração; revemos estudos sobre a relação do amor de longa duração com o bem-estar individual; e concluímos com as implicações para a teoria, pesquisa e aplicações.

Se quiser, pode ver o artigo completo aqui, em inglês.

Fotografia: Nancy Brown

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